Ministério Público ajuíza ação contra ampliação da carga horária de professores do município de Santana do Acaraú


As ampliações foram realizadas através de Leis Municipais nas gestões dos ex-prefeitos Antônio Helder Arcanjo (2014) e José Maria Sabino (2009), os professores devem recorrer em caso de procedência da denúncia.
A descoberta dos fatos pelo MP só foi possível em virtude da Secretaria de Educação do Município se negar a dar resposta a um ofício requerimento de uma professora da rede pública municipal. – Arquivo Pessoal da Professora Dulciné Carneiro

O Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), através da Promotoria de Justiça da Comarca de Santana do Acaraú, ingressou no início do mês de agosto com uma Ação Civil Pública (ACP) contra o Município de Santana do Acaraú, segundo o Promotor Oigrésio Mores os professores do quadro permanente tiveram carga horária ampliada de 20 para 40 horas semanais, sem realização de concurso público, a partir da aprovação de Leis Municipais.
De acordo com levantamento realizado pela Secretaria de Educação do Município de Santana do Acaraú, a pedido do MP a carga horária de 137 professores efetivos foi ampliada de 20 horas para 40 horas semanais. Diante dos fatos a Promotoria de Justiça instaurou ACP, cujo alvo principal será a investigação à inconstitucionalidade das Leis Municipais de nº 693/2009 e 820/2014, por meio das quais foi ampliada a carga horária.
Fique por dentro - Em 2009, o ex-prefeito José Maria Sabino sancionou a Lei n° 693/2009, que dispôs sobre reestruturação do Plano de Carreira e Remuneração dos Profissionais do Magistério da Educação Básica Pública do Município de Santana do Acaraú. Dentre as medidas adotadas, a Lei estabeleceu no Art. 51 que o titular do cargo de professor em jornada parcial, que não esteja em acumulação de cargo, emprego ou função pública, poderá ser convocado para prestar serviços em regime suplementar, até o máximo de mais de 20 horas semanais, para substituição temporária de professores em função docente e nos casos de designação para o exercício de outras funções do magistério. Havendo necessidade do ensino, a Lei estabelece no mesmo Art. 51 o regime de quarenta horas semanais.
A ACP relata ainda que no ano de 2014, o ex-prefeito Antônio Hélder Arcanjo (PCdoB) sancionou a Lei Municipal de nº 820/2014, alterando os artigos 50 e 51 da Lei Municipal de nº 693/2009. A alteração estabeleceu a jornada de trabalho do professor em tempo integral de, no máximo 40 horas, ampliando a carga horária de 20 para 40 horas semanais dos professores efetivos.
Para o promotor de Justiça Oigrésio Mores, o ex-prefeito resolveu, sem a realização de concurso público, efetivar os professores concursados do município de Santana do Acaraú em mais 20 horas semanais, invalidando, além disso, o parágrafo terceiro do artigo 50 da Lei Municipal nº 693/2009, no qual se estabelecia que a jornada de 20 horas semanais do professor em função docente inclui quatro horas-atividades, destinadas, de acordo com a proposta pedagógica da escola, à preparação e avaliação do trabalho didático.
Diante dos fatos, o Promotor avalia que a referida situação encontra-se em contradição com as normas constitucionais e a legislação federal pertinente, pois a dobra da carga horária dos professores, a partir das legislações municipais mencionadas, possibilitaram o aumento da jornada de trabalho dos professores, em detrimento à realização de concurso público, contrapondo-se ao estabelecido na Constituição Federal, no art. 37, II, que preceitua que “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”.
A ACP ressalta ainda que continua em vigor o parágrafo 3º, do artigo 51, da Lei Municipal de nº 693/2009 que estabelece o seguinte: “Cessada a necessidade da alteração de carga horária de trabalho, o docente deveria retornar ao regime normal de trabalho de 20 horas semanais de atividades”. Segundo o promotor, a ampliação da carga horária não pode ser ad eternum (eternamente) em prejuizo de um concurso público realizado pelo Município de Santana do Acaraú ainda em vigor.
O documento menciona também que, após análise dos Editais de concurso Público do Município de Santana do Acaraú de nº 001/1999, 001/2005 e 001/2016, para o cargo de professor, foi verificado que a carga horária corresponde a 20 horas semanais, evidenciando, assim, que os ex-prefeitos deixaram de obedecer aos ditames constitucionais, resolvendo legislar, fora de sua competência, sancionando leis que, materialmente, afrontam a Carta Magna. Para o promotor, o caso não se trata de cumulação, mas, apenas de um cargo público efetivo, que está sendo exercido sem a prévia aprovação em concurso público. O documento ressalta ainda que a conduta adotada pelo Município viola os princípios constitucionais da moralidade e impessoalidade.
Inconstitucionalidade das Leis - Diante do exposto, a ACP requer que seja declarada a inconstitucionalidade das Leis Municipais de nº 693/2009 e 820/2014. Além disso, que o Município adote todas as medidas necessárias para cessar a situação inconstitucional e ilegal de ampliação da carga horária dos 137 professores, convocando e nomeando os professores aprovados e habilitados no último certame ocorrido conforme a demanda atualmente provida pela dobra de carga horária, bem como com vagas compatíveis com a necessidade do quadro de pessoal da Secretaria Municipal de Educação.
Caso a legislação municipal não seja considerada inconstitucional, a ACP requer que o Município promova a elaboração de um edital que regerá o certame responsável pela contratação temporária de profissionais, que deverá ser realizado através de Processo Seletivo Simplificado ou Teste Seletivo, para o período de 06 (seis) meses. Além disso, que seja determinada intimação pessoal do prefeito de Santana do Acaraú Raimundo Marcelo Arcanjo (PMDB) e da secretária municipal de Educação Maria Requxélia de Maria para cumprirem a medida antecipatória, caso concedida. O documento também propõe a fixação de multa pessoal diária no valor de R$ 1.000,00 a ser revertida em prol do Fundo de Modernização e Reaparelhamento do Ministério Público do Estado do Ceará, de acordo com a Lei Estadual nº 16.131/2016, no caso de não cumprimento da medida dentro do prazo estipulado, cujo ônus deverá recair sobre as pessoas do prefeito e da secretária municipal de Educação, de forma a não onerar o erário.
Palavra do Prefeito - O prefeito de Santana do Acaraú, Raimundo Marcelo Arcanjo (PMDB) fez uso da Tribuna durante sessão ordinária da Câmara Municipal de Santana do Acaraú, na manhã desta sexta-feira (4), e informou que o Ministério Público (MP) sugeriu a anulação imediata da ampliação de carga horária suplementar de 137 professores da rede pública municipal. De acordo com o gestor os atos dos prefeitos Antônio Helder Arcanjo (2013/2016) e José Maria Sabino (2009/2011) foram inconstitucionais, ensejando sua imediata revogação. Ele disse ainda que uma professora municipal que pleiteava sua ampliação no colégio João Cordeiro e teve seu pedido negado, procurou o MP para requisitar a nomeação de suas 100 horas. 
O prefeito declara ainda, que o TCM (Tribunal de Contas dos Municípios) e o MP orientaram o gestor a reduzir imediatamente 20% das despesas com a folha de Pagamento, que atualmente está em 63% da Receita Corrente Líquida, o máximo determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal é de 54%. Ainda de acordo com Marcelo Arcanjo, serão cortados cargos comissionados, servidores contratados e caso sejam insuficientes o corte deve atingir também servidores concursados. “O Sinserv deve tomar providências no sentido de defender os interesses dos professores prejudicados e já solicitamos a nossa Procuradoria um parecer sobre o caso e iremos proceder de acordo com a determinação do MP”, ressaltou o prefeito, que sugeriu aos servidores prejudicados que recorram da decisão junto ao Poder Judiciário.
Entenda o caso – A professora efetiva da rede pública municipal há 28 anos, Maria Dulciné Carneiro, requereu em 2016 a ampliação em mais 20 horas de suas atividades no exercício do magistério junto a Secretaria Municipal, uma vez que desde novembro de 2015 trabalhava com carga horária suplementar. A solicitação foi atendida pelo ex-prefeito Helder Arcanjo. De acordo com a declaração da servidora pública, no período de 2013 a 2016, ela exercia cargo de gerente municipal do PAIC (Programa de Alfabetização na Idade Certa) estando temporariamente afastada da sala de aula. Em janeiro desse ano, ela recebeu sua lotação com apenas 20h e ao perguntar a Secretária Municipal, Maria Requixélia de Maria, sobre suas outras 20h, a gestora informou que ela receberia a lotação posteriormente.
Dulciné declarou ainda que, ao receber a referida lotação, esta era para trabalhar na Escola José Otílio Sabino, localizada na Comunidade de São Francisco - Distrito de Baixa-Fria, diante disso, como nunca lecionou ou fez concurso para a zona rural, apresentou um requerimento junto a prefeitura em 23 de janeiro, com um pedido de licença sem remuneração, referente às 20h que deveria lecionar na zona rural. A professora informou que a Prefeitura e a Secretaria Municipal de Educação não se pronunciaram diante do seu pedido de licença. Em 23 de junho desse ano, diante da negligência da resposta da prefeitura, a professora foi ao MP pedir orientação ao Promotor sobre a resposta de seu pedido de licença, segundo a servidora, o Promotor questionou a ampliação dessas cargas horárias no município e disse que iria tomar as medidas cabíveis. Dulciné Carneiro é concursada para o Colégio João Cordeiro desde 1989 com apenas 20h e como a maioria dos professores, com ampliação de carga horária lecionam na mesma escola, a servidora considera justo também ter ampliação na escola onde leciona há 28 anos, ela declara não havia solicitado a ampliação no mesmo período que os demais professores, em virtude de ser professora efetiva do estado com 200 horas, e que atualmente está aposentada de suas funções na esfera estadual. Em 27 de junho a Secretaria de Educação enviou resposta à servidora reafirmando sua lotação na escola da zona rural e fazendo referência à negação, por parte da prefeitura, do pedido de licença sem remuneração.
A professora Dulciné considera tais atos como questões políticas e que até a presente data não recebeu nenhuma notificação e/ou resposta de seu pedido de licença com as devidas justificativas da negativa. "Procurei o advogado do SINVERV para me ajudar a resolver o problema, inclusive, se fosse o caso, entrar com um mandado de segurança para que meu direito fosse resguardado, afinal sou servidora pública do município há 28 anos e nunca pedi uma única licença, quer seja, com  ou sem remuneração e aguardar uma resposta por mais de seis meses e ela vir negada, considero, no mínimo uma atitude desrespeitosa a minha história de professora, que ao longo de quase três décadas colaborei incansavelmente para a educação de nosso município”, desabafou a professora. 
Ela disse ainda que o advogado sugeriu que a mesma fizesse mais uma tentativa junto à Secretária para que reconsiderasse de sua decisão para que o caso, fosse resolvido administrativamente, o que não aconteceu. Segundo declaração da professora a Secretaria de Educação contratou uma professora para substituir a vaga deixada pelos seis meses em que a gestão, não deu resposta ao pedido de licença dela.
A Promotoria decidiu requisitar informações junto a Prefeitura e Câmara Municipal, após análise do conteúdo dos atos dos gestores, ingressou com uma Ação Civil Pública e sugeriu ao atual prefeito Raimundo Marcelo Arcanjo a anulação imediata das ampliações de todos os professores beneficiados. Nossa reportagem já apurou que o número de educadores afetados pela decisão pode superar os 160 profissionais. Há ainda outro dilema que a atual gestão precisa resolver, alguns professores, que fizeram o último concurso público realizado em 2015, estão aguardando a convocação para assumir seus cargos, os efeitos da redução das cargas horárias abririam precedentes para a convocação imediata dos professores, que aguardam suas convocações. 
Sinserv – O presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais (SINSERV), Oziel da Costa Cabral, gravou um vídeo de esclarecimento, ao lado do advogado Victor Vasconcelos, o sindicalista declara que a instituição, já está tomando as medidas necessárias para defender seus associados, segundo Cabral os atos dos prefeitos foram legais, “iremos mostrar ao Promotor que nada foi feito irregular e tudo vai dar certo, fiquem cientes que vamos conseguir”, ressaltou Cabral. O advogado do Sinserv Victor Vasconcelos ressaltou ainda que irá defender os interesses dos servidores “iremos lutar incansavelmente para que todos os servidores sejam protegidos e mostrar a legalidade de todos os atos dessas efetivações”, disse o advogado no vídeo.
Nossa reportagem entrou em contato com o Presidente do Sinserv, Oziel da Costa Cabral, mas não tivemos resposta, já a secretária municipal de educação, Maria Requixélia de Maria, disse que só deverá se pronunciar quando for oficialmente notificada pela justiça.
Fontes: Nossa reportagem colheu informações no portal do Ministério Público Estadual, Vídeos Publicados em Redes Sociais da diretoria do Sinserv e da Câmara Municipal de Santana do Acaraú e entrevista e documentos apresentados pela Professora Maria Dulciné Carneiro.   

Manoelzinho Canafístula - Jornalista